sábado, 29 de maio de 2010

O CONDE DE SAINT GERMAIN E HELENA PETROVNA BLAVATSKY

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O Conde de Saint-Germain e H.P.B.
Dois Mensageiros da Loja Branca
Por H.S.Olcott (1º Pres. da Soc.Teosófica)

Reimpresso de The Theosophist Julho de 1905


Theosophical Publising House, Adyar, Chennai (Madras), ÍndiaJunho de 1918




Para mim, uma das figuras mais pitorescas, impressionantes e admiráveis na história moderna é o fazedor de maravilhas cujo nome intitula este artigo. O mundo não o vê como um recluso do deserto ou da selva, sujo, encarquilhado, cabeludo e vestido com farrapos, vivendo à parte de seus semelhantes e desprovido de simpatias humanas; mas como alguém que entre o esplendor das mais brilhantes cortes européias igualou-se aos maiores personagens que se movem no painel da história. Ele sobressaiu-se acima de todos eles – reis, nobres, filósofos, estadistas e homens de letras, na majestade de seu caráter pessoal, na nobreza de seus ideais e motivos, na consistência de seus atos e na profundidade de seu conhecimento, não só dos mistérios da Natureza, mas também da literatura de todos os povos e épocas. Lendo tudo o que eu pude encontrar sobre ele, incluindo os instrutivos artigos da Srª Cooper-Oakley no Theosophical Review (vols. 21 e 22), passei a amá-lo e também admirá-lo; amá-lo como amava H.P.B. [Helena Petrovna Blavatsky ]; e pela mesma razão – pois ele foi um mensageiro e agente da Loja Branca, cumprindo sua missão com altruística lealdade e fazendo para beneficiar os outros tudo o que cabe dentro do poder humano.
A recente leitura de uma memória biográfica sob a forma de um romance histórico, do famoso Souvenirs do Barão de Gleichen; de um interessante artigo no volume 6 do Le Lotus Bleu; do artigo sobre o Conde na Encyclopaedia Britannica, e noutras publicações, reavivou todas as minhas lembranças do que eu ouvira sobre ele, e, mais importante ainda, persuadiu-me de sua identidade com um dos mais encantadores dos Personagens Invisíveis que permaneceram por trás da máscara de H.P.B. durante a escrita de Ísis sem Véu. Quanto mais eu penso nisso, mais completamente me convenço da verdade desta suposição.


Antes de entrar nesses detalhes, contudo, será bom simplesmente dizer que um dia, no século XVIII, ele apareceu na França sob o nome mencionado acima. É dito que ele o havia tomado de uma propriedade comprada por ele no Tirol. A Srª Cooper-Oakley dá, baseada na autoridade da Srª. d’Adhémar, uma lista dos diferentes nomes sob os quais este fazedor de época foi conhecido, desde o ano 1710 até 1822. Cito os seguintes: Marquês de Montferrat, Conde Bellamare, Cavaleiro Schoening, Cavaleiro Weldon, Conde Soltikoff, Conde Tzarogy, Príncipe Ragoczy, e finalmente, Saint-Germain. A Srªa Oakley, com a ajuda de amigos, procedeu a uma industriosa pesquisa nas bibliotecas do Museu Britânico e noutras de diversos reinos europeus. Ela pacientemente reuniu, de várias fontes, fragmentos de história que identificariam o grande Conde com os personagens conhecidos sob estes diferentes títulos. Mas é aceito por todos os que escreveram sobre ele que o verdadeiro segredo de seu nascimento e sua nacionalidade jamais foi descoberto; todas as diligências das autoridades policiais de diferentes países resultaram somente em fracasso. Um outro fato de grande interesse é o de que nenhum crime nem intenção criminosa nem fraude jamais foram provados contra ele; seu caráter era inatacável, seus propósitos, sempre nobres. Embora vivendo no luxo e parecendo possuir uma riqueza inesgotável, ninguém jamais pôde saber de onde vinha seu dinheiro; ele não mantinha contas em banco, não recebia ordens de pagamento, não desfrutava de pensão de nenhum governo, recusou todas as ofertas de presentes e benefícios feitas a ele pelo Rei Luís XV e por outros soberanos, mas ainda assim sua generosidade era principesca. Aos pobres e miseráveis, aos doentes e oprimidos, ele era uma encarnação da Providência; entre outros benefícios públicos, fundou um hospital em Paris, e possivelmente outros em outros lugares.


Grim, em sua celebrada Correspondance Littéraire, que é descrita pela Britannica como "o mais valioso registro remanescente de algum período literário de importância", afirma que Saint-Germain era "o homem mais ilustrado que ele jamais vira". Ele conhecia todas as línguas, toda a história, toda a ciência transcendental; não aceitava presentes ou patrocínios, e recusava todas as ofertas disto, dava prodigamente, fundou hospitais, e trabalhava sempre, e sempre arduamente, pelo benefício da raça. Alguém poderia pensar que um homem como este poderia ter sido poupado pelo maledicente e pelo caluniador, mas não foi; enquanto ainda vivia e desde sua morte (ou antes desaparecimento) os mais reles insultos têm chovido sobre sua memória. Diz a Britannica que ele foi "um célebre aventureiro do século XVIII que assegurando ter descoberto alguns segredos extraordinários da natureza exerceu considerável influência em diversas Cortes européias. (...) Era dito comumente que ele obtinha seu dinheiro desempenhando as funções de espião para uma das Cortes européias".


A mesmíssima opinião sobre ele é ecoada por Bouilferet em seu Dictionnaire d’Histoire et de Geographie, e por diversos outros escritores. Temos várias descrições da aparência pessoal do Conde de Saint-Germain, e embora elas difiram um pouco nos detalhes, todas o descrevem como um homem de saúde radiante, e de inalterável cortesia e bom-humor. Suas maneiras eram a perfeição do refinamento e da graça. Ele parece ter sido um lingüista notável, falando fluentemente e usualmente sem sotaque estrangeiro as línguas correntes da Europa. Um escritor, assinando-se Jean Léclaireur, diz em um interessante artigo sobre O Segredo do Conde de Saint-Germain, no Lotus Bleu, vol. VI, 314-319, que ele estava familiarizado com o francês, inglês, italiano, espanhol, português, alemão, russo, dinamarquês, sueco e muitos dialetos orientais. Sua maestria nestes últimos fornece um dos pontos de semelhança que são tão extraordinários entre ele e H.P.B., pois Sua Alteza, o falecido Príncipe Emil de Sayn-Wittgenstein, Adido do Corpo Diplomático junto ao Imperador Nicolau e um antigo membro de nossa Sociedade, uma vez escreveu-me que quando ele conheceu H.P.B. em Tiflis, ela era famosa por sua habilidade de falar a maioria das línguas do Cáucaso – geórgio, mingreliano, abásio, etc, enquanto que nós mesmos a temos visto produzir literatura de qualidade superior em russo, francês e inglês. Mas quanto mais se lê sobre Saint-Germain e se conhece sobre H.P.B., mais numerosas e notáveis são as semelhanças entre os dois grandes ocultistas. A Srª Cooper-Oakley em sua cuidadosa compilação diz (Theosophical Review, vol. XXI, p. 428): "Era consenso quase universal que ele tinha uma graça e cortesia de maneiras encantadoras. Ele apresentava em sociedade, além disso, uma grande variedade de dons, tocava vários instrumentos musicais excelentemente, e às vezes demonstrava faculdades e poderes que beiravam o misterioso e o incompreensível. Por exemplo, um dia ele lhe tinha ditado os primeiros vinte versos de um poema, e os escreveu simultaneamente com ambas as mãos em duas folhas separadas de papel – e ninguém presente poderia distinguir uma folha da outra".


O Sr. Léclaireur, no artigo supracitado, sumarizou muitos pontos sobre o Conde de Saint-Germain que corroboram a citação e parecem ter sido cuidadosamente compilados da literatura sobre o assunto. Ele diz que "sua beleza era notável e suas maneiras esplêndidas; ele tinha um extraordinário talento para a elocução, uma educação e erudição maravilhosas. (...) Músico completo, ele tocava todos os instrumentos, mas agradava-o mais o violino; ele o fazia soar tão divinamente que duas pessoas que ouviram a ele e depois ao afamado mestre italiano Paganini colocaram ambos no mesmo nível". Aqui lembramos a soberba facilidade de H.P.B. como pianista, seu toque ligeiro, sua capacidade improvisativa e seu conhecimento da técnica. O Barão Gleichen cita-o dizendo assim:


"Vocês não sabem do que estão falando; só eu posso discutir este assunto, o qual já esgotei, como o fiz com a música, que abandonei porque nela não podia ir mais além". O Barão foi convidado à sua casa com o objetivo declarado de examinar algumas pinturas muito valiosas, e o Barão diz que "ele manteve a palavra, pois as pinturas que ele me mostrou tinham o caráter de singularidade ou de perfeição, que as fazia mais interessantes que muitas das pinturas de primeira linha, especialmente uma Sagrada Família, de Murillo, que igualava em beleza a de Rafael em Versalhes; mas ele me mostrou muito mais que isso, a saber: uma quantidade de gemas, especialmente diamantes, de cores, tamanho e perfeição surpreendentes. Eu pensei que estava contemplando os tesouros de Aladim. Dentre outras havia uma opala de tamanho monstruoso e uma safira branca tão grande quanto um ovo, que empalideceu todas as gemas que eu coloquei ao lado para comparar. Suponho ser um conhecedor de jóias, e declaro que o olho não poderia descobrir a menor razão para duvidar da qualidade destas pedras, ainda mais que não estavam engastadas".


Muitos anos atrás minha irmã, Srª. Mitchell, sentindo-se indignada pelas calúnias baixas que estavam circulando contra H.P.B. e mim mesmo, e desejando deixar registrado um relato de alguns dos fatos que foram observados por ela própria enquanto ocupava, com seu marido e filhos, um apartamento no mesmo edifício que o nosso, publicou em um jornal londrino um artigo no qual citava, entre outros, o seguinte incidente: "Um dia ela disse que me mostraria algumas coisas belas, e indo até uma pequena escrivaninha que ficava debaixo de uma das janelas, pegou dela muitas peças de soberba joalheria; broches, pregadores, braceletes e anéis, que estavam cravejados com todos os tipos de pedras preciosas, diamantes, rubis, safiras, etc. Eu as peguei e examinei, mas pedindo para vê-las no dia seguinte só encontrei gavetas vazias". Minha irmã pensou que elas deviam valer bem muitos milhares de dólares. Mas como aconteceu de eu saber que H.P.B. não tinha nenhuma coleção de pedras preciosas como esta, nem mesmo uma pequena parte delas, minha única inferência possível é a de que ela havia forjado para a visão de minha irmã uma daquelas ilusões ópticas que ela descrevia como truques psicológicos. Sou inclinado a acreditar que Saint-Germain fez o mesmo com o Barão Gleichen. Na verdade, estes fazedores de maravilhas podem ao bel prazer transformar uma ilusão em realidade e fazer as pedras sólidas e permanentes. Tomemos por exemplo meu "anel da rosa" (vide O.D.L., I, 96) que ela primeiro fez surgir a partir de uma rosa que eu segurava na mão, e, dezoito meses mais tarde, quando minha irmã o usava, fez com que três pequenos diamantes aparecessem engastados no ouro, em forma de triângulo. Muitas pessoas em diferentes países viram este anel, e algumas me viram escrever com ele sobre vidro, provando assim que as pedras são diamantes genuínos. O anel ainda está em meu poder, e durante estes trinta anos não mudou em nada suas características. Além disso, há os casos de sua duplicação de um diamante amarelo para o Sr. Sinnett em Simla, de safiras para a Srª.


Carmichael e outros amigos de diversos lugares, sua produção do seu místico anel de sinete, agora de posse da Srª. Besant, ao esfregar entre suas mãos meu próprio anel de sinete gravado; e as híbridas pinças para cubos de açúcar de prata, e, primeiro e último, muitos artigos de metal e pedra que, tendo sido devidamente descritos em meu O.D.L., não precisam ser recapitulados aqui. O leitor verá que os respectivos fenômenos de Saint-Germain e H.P.B. complementam-se e se corroboram mutuamente, e demonstram que entre os ramos da ciência oculta que são familiares aos adeptos e seus discípulos avançados deve ser incluído um conhecimento íntimo e controle do reino mineral. Saint-Germain contou a alguém que ele havia aprendido de um velho Brâmane hindu como "reviver" o carbono puro, isto é, como transmutá-lo em diamante; e Kenneth Mackenzie é citado como dizendo (na sua Royal Masonic Cyclopaedia, p. 644): "Em 1780, durante sua visita ao embaixador francês em Haia, ele despedaçou com um martelo um soberbo diamante que havia produzido por meios alquímicos; uma pedra gêmea desta, também feita por ele, vendeu-a a um joalheiro pelo preço de 5.500 luíses de ouro".Não temos em nenhum destes relatos evidência de se alguma das gemas feitas por ele permaneceram sólidas ou se se dissolveram de volta na luz astral de onde foram constituídas, exceto nos casos específicos onde a gema foi dada a algum indivíduo, ou neste em que a gema foi vendida a um joalheiro. Para mim é impensável que ele tenha vendido o diamante para conseguir 5.500 luíses, pois o fato de ele ter o aparente comando ilimitado sobre o dinheiro mostra que ele não poderia ter tido necessidade de uma soma tão pequena.


Falamos antes sobre a dissolução de uma gema criada magicamente. Se o leitor consultar o O.D.L., 197 e 198, verá que a primeira pintura do "Cavaleiro Louis", precipitada por H.P.B. em certa noite, havia-se desvanecido pela manhã, mas que quando ela a fez aparecer de novo, ao pedido da Srª. Judge, ela o "fixou" de modo que permanece inalterada até o momento deste escrito. Minha explicação disto é que depende inteiramente do adepto operador se ele fará uma precipitação efêmera da imagem-pensamento, deixando-a ser dissipada pela ação do espaço, ou se ao depositar o pigmento cortar a corrente que o conecta com o espaço e assim deixando-o como um depósito pigmentar permanente no papel ou noutra superfície. De fato eu aconselho encarecidamente a qualquer um que queira abordar os mistérios de Saint-Germain, Cagliostro e outros operadores de prodígios, ler em conexão a isto os vários relatos dos fenômenos de H.P.B. que têm sido publicados por testemunhas fidedignas. Tomemos por exemplo a citação feita pela Srª. Cooper-Oakley dos Souvenirs de Marie-Antoinette, da Condessa d’Adhémar, que havia sido amiga íntima da rainha e que faleceu em 1822. Ela dá um interessante relato de uma entrevista entre Sua Majestade, o Conde de Maurepas, ela mesma e Saint-Germain. Este último havia feito à Srª. d’Adhémar uma visita de importância momentosa em relação à família Real e a França, e havia ido embora, e o ministro, Sr. de Maurepas, havia entrado e estava ultrajando com injúrias a Saint-Germain, chamando-o de impostor e charlatão. Recém ele havia dito que o mandaria para a Bastilha, a porta se abriu e Saint-Germain entrou, para consternação do Sr. de Maurepas e a grande surpresa da Condessa. Andando majestaticamente em direção ao Ministro, Saint-Germain advertiu-o de que ele estava arruinando tanto a monarquia quanto o reino com sua incompetência e obstinada vaidade, e terminou com as palavras: "Não espere homenagem da posteridade, Ministro frívolo e incapaz! Sereis enfileirado entre aqueles que causam a ruína de impérios. (...) O Sr. de Saint-Germain, tendo falado isso num só fôlego, dirigiu-se para a porta novamente, fechou-a e desapareceu. (...) Todos os esforços de encontrar o Conde falharam". Compare-se isto com as diversas desaparições de H.P.B. nas grutas Karli e arredores, e noutros locais, e vejam como os dois agentes da Fraternidade empregaram meios idênticos de se fazerem invisíveis no momento crítico.


Ele vivia suntuosamente e aceitava convites para jantar de reis e outras personalidades importantes, mas sempre subentendendo-se que não se esperasse que ele comesse ou bebesse com o grupo; e, de fato, ele nunca o fez, dando a desculpa de que ele era obrigado a seguir um regime muito restrito e especial. Dizia-se que ele mantinha seu corpo forte, jovem e são tomando elixires e essências, cuja composição mantinha em segredo; alegava-se que sua dieta visível era somente o que poderíamos chamar de mingau de aveia, o qual também era preparado por ele mesmo. O Sr. Léclaireur diz que ele "freqüentemente se deitava muito tarde, mas nunca estava cansado; ele tomava grandes precauções contra o frio. Freqüentemente abandonava-se a um estado letárgico que durava de trinta a quarenta horas, durante o qual seu corpo parecia morto. Depois acordava, recuperado e rejuvenescido e revigorado por este mágico descanso, e assombrava os presentes relatando todas as coisas importantes que haviam transcorrido na cidade ou nos negócios públicos durante o intervalo. Suas profecias, assim como sua previsão, nunca falharam".
Isto lembra a história contada por Collin de Planey (Dictionnaire Infernal, vol. II, p. 233) sobre Pitágoras, que ao retornar de suas viagens ao plano astral "sabia perfeitamente de tudo que acontecera na Terra durante sua ausência".


Continuando nossa comparação entre os dois "mensageiros", amigos e colaboradores, vemos que H.P.B. não se limitava a mingau ou mesmo à dieta vegetariana, mas, como o Conde, também caía naqueles estados de letargia quando ficava inconsciente das coisas em seu redor, mas que voltava inteirada de tudo durante o intervalo de sua abstração física temporária. No primeiro volume do O.D.L. são descritos estes estados de "estudo obscuro" [brown study, no original – NT], e também suas alterações de humor e modos conforme um ou outro Mestre estivesse "em guarda". Também é registrado como a nova entidade entrante tinha de captar no cérebro do corpo o registro do que recém havia acontecido; algumas vezes cometendo erros palpáveis. Infelizmente não temos registro do efeito produzido em Saint-Germain de ser despertado subitamente de sua condição de transe recuperador, provavelmente porque ele sempre tomou precauções contra este tipo de ocorrência; mas no caso de H.P.B. descrevi o grande choque que ela experimentava quando súbita e inesperadamente era trazida de volta à consciência física; mais de uma vez ela colocou minha mão em seu peito para me fazer sentir o coração batendo como uma britadeira, e ela me disse que sob certas circunstâncias tal ocorrência poderia ser fatal. Não estou aludindo aos casos em que ela deixava o corpo uma ou mais horas para ser usado por um ou outro dos Mestres que supervisionavam a produção de Ísis sem Véu, mas somente àqueles breves deslocamentos do plano de consciência externo para o interno.


Em um outro ponto havia grande diferença entre os dois mensageiros. Saint-Germain amiúde, quando a conversa se voltava para qualquer período do passado, descreveria o que havia acontecido como se ele mesmo tivesse estado presente, e, como nos diz o Barão Gleichen, "descreveria as circunstâncias mais detalhadas, as maneiras e gestos dos personagens, e mesmo a sala e local que ocupavam, com uma minúcia e vivacidade que fazia pensar que estava-se ouvindo a um homem que realmente estivera presente. (...) Ele conhecia, em geral, a história com precisão, e criava a representação de quadros e cenas mentais com tamanha naturalidade, que nenhuma testemunha ocular o faria a respeito de fatos recentes como ele o fazia sobre aqueles de séculos passados". As revelações da psicometria tornaram perfeitamente fácil para nós entender como um adepto, como evidentemente o era Saint-Germain, poderia evocar das "galerias da luz astral os incidentes de qualquer época histórica dada, mesmo os detalhes da construção da casa, e a aparência, atos, falas e gestos dos habitantes; e espalhando em todas as direções seu poder de observação como uma teia de aranha, saberia de quaisquer fatos em andamento. Sem ter encarnado naqueles tempos remotos, mesmo assim se tornava em verdade uma testemunha ocular e auditiva daquele período em questão". Esta é a esplêndida potencialidade da descoberta de Buchanan, que marcou época. Não encontramos no Soul of Things de Denton listas de casos onde psicômetras treinados faziam a mesma coisa? E se os membros da família de Denton podiam fazer isso sem treinamento oculto prévio, por que não deveria um ser tão grandioso como Saint-Germain ter sido capaz de fazer muito mais?
Vimos acima que ele persistentemente mistificava aquelas pessoas curiosas de todas as classes – reis, nobres e plebeus – que tentavam penetrar o segredo de seu nascimento, nacionalidade e idade. Não temos visto H.P.B. pregando a mesma peça em seus fuxiqueiros importunos? Às vezes ela diria que tinha oitenta anos, às vezes que havia nascido no século XVIII, e temos registrado o testemunho de um correspondente da imprensa que, depois de observá-la durante toda uma noite, disse e escreveu que ela parecia em um momento ser uma velha e logo a seguir uma jovenzinha, enquanto que mais de uma pessoa viu sua aparência física mudar de um sexo para outro. Então temos o caso em que, quando ela e eu estávamos a sós na sala de nossa "Lamaseria" [apelido da casa onde moravam – NT] em Nova Iorque, ela atraiu minha atenção e eu vi surgir de seu corpo o de um Mestre com sua compleição indiana e cabelo negro, desvanecendo por um momento a mulher de tipo caucasiano, olhos azuis e cabelo claro que estava sentada à minha frente.


Léclaireur diz, como prova da memória prodigiosa do Conde, que "ele podia repetir exatamente e palavra por palavra o conteúdo de um jornal que apenas havia relanceado diversos dias antes; ele podia escrever com ambas as mãos ao mesmo tempo; com a direita um poema, com a esquerda um documento diplomático, freqüentemente da maior importância. Muitas testemunhas ainda vivas poderiam, no início deste século (XVIII), corroborar estas faculdades maravilhosas. Ele lia, sem as abrir, cartas fechadas, e mesmo antes chegarem a ele". Aqui, novamente, somos obrigados a lembrar dos feitos do mesmo tipo que H.P.B. operava em presença de testemunhas, incluindo eu mesmo. Ela, ainda, não apenas leria cartas fechadas antes de tocar nelas, mas também tomaria um lápis e escreveria seu conteúdo, como nos casos do Sr. Massey e outros em Nova Iorque, e o do Prof. Smith em Bombaim, cuja carta era interessante. Certa manhã Damodar [Damodar Mavalankar, do círculo Teosófico indiano – NT] recebeu quatro cartas por um correio, que continham adicionalmente mensagens dos Mahatmas, como constatamos ao abrí-las. Eram de quatro locais muito distantes entre si, e todas com o carimbo dos correios. Mandei todas ao Prof. Smith, assinalando que freqüentemente recebíamos tais escritos dentro de nossa correspondência, e pedi-lhe que gentilmente primeiro examinasse cada envelope para verificar se havia algum sinal de terem sido violados. Ao devolvê-las a mim com a declaração de que todas estavam perfeitamente regulares, até onde se podia averiguar, pedi a H.P.B. que as colocasse em frente à sua testa e visse se podia encontrar alguma mensagem dos Mahatmas em alguma delas. Ela o fez com as primeiras que chegaram, e disse que em duas havia tais mensagens. Então ela leu clarividentemente as mensagens e pedi ao Prof. Smith que as abrisse ele mesmo. Depois de as haver escrupulosamente examinado, ele cortou os envelopes, e todos nós vimos e lemos as mensagens exatamente como H.P.B. as havia decifrado pela visão clarividente.


Uma forma de fenômeno, entretanto, de que não encontramos relato em Saint-Germain, era o da interceptação de cartas no correio, que em minha opinião está entre as coisas mais notáveis que já testemunhei. Toda história está contada no O.D.L., Primeira Série, pp. 35-37, mas pode ser resumida em poucas palavras. Eu tinha vindo de Nova Iorque para Filadélfia para visitar H.P.B., enquanto tirava uma folga depois de ler o livro de Eddy, People from the Other World, não impresso. Tencionando ficar só dois ou três dias e não sabendo qual seria meu endereço em Filadélfia, não havia deixado instruções para o repasse de minha correspondência; mas ocorrendo de ela insistir que eu ficasse mais tempo, fui à Agência dos Correios de Filadélfia, dei o endereço de sua casa e solicitei que se algo chegasse para mim, deveria ser mandado para lá. Eu não estava esperando nada, mas algo ou alguma coisa me impeliu a agir assim. Na mesma tarde foram entregues na casa pelo carteiro cartas da América do Sul, da Europa e de alguns dos estados do leste da União, com o endereço da casa de H.P.B. escrito a lápis em cada envelope. Mas, e isto é que dá o selo de valor como evidência ao fenômeno, o endereço de Nova Iorque não foi anulado, nem o carimbo dos Correios de Nova Iorque aparece na frente dos envelopes, como prova de que eles teriam chegado no primeiro destino tencionado por meus diversos correspondentes. Qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento dos procedimentos postais verá a grande importância destes detalhes. Mas ao abrir as cartas que me chegaram deste modo durante minhas visitas noturnas à minha colega, encontrei dentro de muitas delas, se não de todas, algo escrito com a mesma caligrafia das cartas que eu havia recebido dos Mestres em Nova Iorque, o escrito tendo sido feito ou nas margens ou em qualquer espaço deixado em branco pelos que as escreveram. As coisas escritas eram ou algum comentário sobre as características ou motivações do correspondente, ou assuntos de interesse geral em relação aos meus estudos ocultos.


As histórias da época todas falam de Saint-Germain e do importante papel desempenhado por ele na política do momento de mais de um reino. Assim é dito que ele teve muito a ver com a ascensão da Imperatriz Catarina ao trono da Rússia. Ele foi amigo íntimo de Frederico o Grande da Prússia, de Luís XV da França, do Landgrave de Hessen, e de vários príncipes e de outros grandes nobres. Por muitos anos ocupou um grande lugar no pensamento público de várias cortes e nações, mas, de súbito, no ano de 1783, desapareceu da vista pública com o mesmo mistério cercando sua retirada de cena que cercara sua aparição. Não temos registro de seu destino, além da declaração de seu amigo, o Príncipe de Hesse-Cassel, de que ele falecera em 1783, durante alguma experiência química em Eckenford, perto de Schleswig. Não há absolutamente nenhum registro histórico da doença final ou morte deste homem que, por tantos anos, agitou as cortes européias, nem uma só palavra sobre a destinação de sua alegada fortuna colossal, em gemas e ouro, que ele sempre tinha consigo. Como diz Léclaireur: "Um homem que teve uma carreira tão brilhante não pode se extinguir tão subitamente de modo a cair no esquecimento".


Além disso, como o mesmo autor diz: "É relatado que ele teve uma entrevista com a Imperatriz da Rússia em 1785 ou 1786. É relatado que ele apareceu à Princesa de Lamballe quando ela estava diante do tribunal revolucionário, logo antes que cortassem sua cabeça, e para a amante de Luís XV, Jeanne Dubarry, enquanto ela esperava o golpe mortal, em 1793. A Condessa d’Adhémar, que morreu em 1822, deixou uma nota manuscrita, datada de 12 de maio de 1821, e presa com um alfinete ao manuscrito original, onde diz que "vira o Sr. de Saint-Germain diversas vezes depois de 1793, a saber, no assassinato da Rainha (16 de outubro de 1793); no 18 Brumário (9 de novembro de 1799); no dia seguinte à morte do Duque d’Enghien (i804); no mês de janeiro de 1813; e na véspera da morte do Duque de Berri (1820)". Deve ser observado paralelamente que estas últimas visitas à sua amiga, a Condessa, depois de seu desaparecimento de Hesse-Cassel e sua suposta morte, podem ter sido feitas da mesma maneira que a do Mestre a mim mesmo em Nova Iorque – no corpo astral projetado; pois temos, no artigo da Srª. Cooper-Oakley, uma citação das Memoirs de Grafer, a declaração de que Saint-Germain disse a ele e ao Barão Linden que deveria desaparecer da Europa por volta do final do século XVIII, e mudar-se para uma região dos Himalaias, acrescentando: "Vou descansar; eu preciso descansar. Exatamente em oitenta e cinco anos as pessoas novamente porão os olhos sobre mim. Adeus, eu vos amo". A data desta entrevista pode ser deduzida aproximadamente de um outro artigo no mesmo volume, onde é dito: "Saint-Germain esteve em Viena no ano de 1788, ou 1789, ou 1790, onde tivemos a inesquecível honra de encontrá-lo". Se tomarmos a primeira data, então oitenta e cinco anos nos trariam a 1873, quando H.P.B. veio a Nova Iorque para me encontrar; se tomarmos a segunda, então oitenta e cinco anos coincidem com nosso encontro em Chittenden; se a terceira, isso marca a data de fundação da Sociedade Teosófica e o início da escrita de Ísis sem Véu, em cujo trabalho, como já disse, estou persuadido de que Saint-Germain foi um dos colaboradores.


Assim, tracei brevemente, mas de boa fé, a relação entre estes dois personagens misteriosos, Saint-Germain e H. P. Blavatsky, mensageiros e agentes da Loja Branca, como acredito. Um foi mandado para auxiliar na condução das linhas de karma convergentes que ocasionariam o cataclismo político do século XVIII com todas as suas terríficas conseqüências, desencadeando o ciclone moral que haveria de purificar a atmosfera social do mundo; a outra veio numa época em que o materialismo iria encontrar seu Waterloo e o novo reino de elevado pensamento espiritual deveria ser anunciado através da atuação de nossa Sociedade.


(Tradução: Ricardo Frantz)

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